Estou devendo a um amigo este texto,
já há algum tempo. Ele pediu que eu descrevesse como é ser o estereótipo da
beleza e como fiquei olhando sem saber o que queria me dizer, explicou: Loira, alta, magra, olhos azuis, corpo delineado, bonita... Bom, vou
dizer então como é ser o estereótipo social da beleza {e não que eu o aprove}.
Quando as pessoas me olham, e se
deixam levar por uma ideia coletiva daquilo que eu sou, elas se precipitam em
um julgamento pré-concebido do meu ‘eu’. Parece mentira, mas eu tenho de provar
para algumas pessoas que não sou fútil, nem vulgar, ‘fácil’, burra, esnobe e
etc.
Alguns me olham, veem um sorriso no
meu rosto {sim, sorrio muito} e creem que minha vida é perfeita, um conto de
fadas ou algo assim. Pelo contrário, eu sorrio porque foi minha escolha:
encarar a vida pelo lado positivo, ter bom-humor apesar dos contratempos e das
tristezas. Se me permitir ficar ‘carrancuda’ de nada vai adiantar e ainda por
cima vou ter de me aturar desse jeito. Prefiro ser uma boa companhia para os
outros e, acima disso, para mim mesma – porque eu passo a maior parte do tempo
convivendo comigo, não é?
Nasci em um bairro simples e tive de
conviver com a violência bem de perto. Acho que foi com uns oito anos de idade
que vi uma arma pela primeira vez: apontada para minha mãe e para mim, enquanto
éramos assaltadas (assaltos foram alguns... não fiz questão de contar). Tive o
infortúnio de veri uma arma mais uma vez pelo menos antes dos 12 anos de idade.
Nossa casa foi arrombada duas vezes e é bem angustiante saber de outra pessoa
ali, vasculhando os nossos pertences e levando aqueles tidos como ‘de valor’.
Sem falar que era difícil dormir uma noite de sono inteira tranquilamente
quando se ouvia gritos, tiros ou se sabia da possibilidade de um aparente
barulho no telhado provocado pelo vento ser alguém tentando entrar. Foi ótimo
conhecer a sensação de dormir uma noite inteira, sem acordar sobressaltada por
algo assim, e isso aconteceu quando tinha 16 anos – ao ir morar em um
apartamento num condomínio fechado.
{Posso dizer que a minha vida só
melhorou, com o tempo e as novas oportunidades, através das escolhas e,
sobretudo: da vontade de crescer como pessoa e ser ao menos um pouco melhor a
cada dia. É algo difícil de optar, pois é sempre mais fácil acomodar-se e seguir
caminhando por onde a ‘correnteza’ te leva.}
Eu posso parecer uma boneca, de
longe. De perto vão ver que tenho cicatrizes de tombos de infância, que tenho
dores, medos, sonhos. E perceberão as falhas, as opiniões radicais em alguns
pontos... Vão se dar conta de que eu tenho um coração, e sangra. Minha vida
emocional está longe dos contos de fadas imaginados pelos outros - já tive
paixões platônicas, tomei foras, fui traída. Já tive de me reerguer depois de
final de relacionamento e também passei por desmanchar a ilusão de estar com
alguém que não dava a mínima pra mim e com quem nunca teria um relacionamento.
Sofrer por amor: conheço bem. Se iludir: idem. Desistir de alguém: bingo!. A
vida é assim mesmo, e algumas mulheres creem {inocentemente} ser um corpo, uma ‘embalagem’,
capaz de conquistar e fazer tudo dar certo na vida. Pois bem, eu sei bem que
isso é uma ‘balela’: não interessa o corpo que nós temos e sim como nós nos
sentimos dentro dele. A forma como interagimos com o ‘mundo’ ao nosso redor é
bem mais importante do que não ter celulite, ter um corpo escultural, cabelos
esvoaçantes, olhos azuis ou qualquer outra invenção dessas.
Mais um problema, de ser um
estereótipo, é o fato de algumas mulheres não quererem a minha companhia. Eu
realmente não sei, não entendo... pode ser competição, por se sentirem
intimidadas de alguma maneira, ou quem sabe eu sou tremendamente chata e
entediante {quem sabe?}. Na maioria das vezes eu sou realmente muito simpática,
e não faço esforço para isso: eu sou assim. Infelizmente parece que as outras
mulheres percebem isso como uma ‘forçação’ de barra, me fazendo passar por
boazinha e etc. Pelo que percebo os homens parecem gostar da minha companhia,
entretanto eu tenho de ‘provar’ que a minha simpatia é só ‘eu sou legal, tá?’
em vez de ‘olha, sou fácil’.
Sem falar no comprometimento
intelectual: loira, bonita, simpática... ‘hum, ela deve ser burra’. Não, sinto
muito. Sou bem inteligente e tenho bastante personalidade, sou palpite, opino,
critico, falo mesmo... não tenho a menor vocação pra moça comportada que se
submete às vontades alheias. Acabo sendo polêmica algumas vezes em alguns
diálogos. Sempre gostei de ser eu mesma, original de alguma maneira, sem ser
parte de alguma ‘catalogação social’. Pergunto quando não sei e esboço teorias
de vez em quando. Sei da quantidade enorme de coisas desconhecidas por mim e que
talvez a maioria ainda vá permanecer assim, mesmo com o tempo e as
experiências.
Então, esse é um resumo. Gosto da
ideia de que as pessoas vão começar a se olhar através das aparências, em busca
das essências. Ir além da superfície das impressões manipuladas pela sociedade,
mídia ou preconceitos e realmente tentarem conhecer o outro por dentro, pelo
avesso. Somos feitos de muito mais e o importante está sob a maquiagem, roupa, corte
de cabelo... status social, religião, partido político, time de futebol ou
qualquer outra forma de segmentação. Talvez algumas pessoas me olhem desse modo
segmentado e limitado, deixando assim de saber quem sou realmente. Estou fora
de qualquer rotulação, todos estamos – cada um é único. Eu procuro derrubar os
muros que me impedem de conhecer {o máximo possível} aquele outro ser em
contato comigo, não importa quanto dure a nossa ‘interação’.
{Quando percebo a realidade de
outras pessoas, bem piores do que qualquer história triste vivida por mim, eu
me sinto egoísta e prepotente – julgando as minhas tristezas maiores do que as
alheias. E há inúmeras pessoas com bagagens duras de se carregar e suportar.
Prefiro usar a minha como degrau, para elevar minha consciência na caminhada da
existência. Esse texto foi um pequeno #mimimi, um desabafo, estou pra
escrevê-lo desde o ano passado.}