Era um destino fatal o dela. Tinha que seguir seus instintos e deixar-se viver entre os leões daquela floresta particular e como não havia muita escolha se quedou ali para tentar ganhar forças e lutar contra. Amanheceu cedo naquele domingo de outono e resolveu pôr leite pra ferver e fazer um chocolate quente, não muito tempo depois ele resolveu acordar também. Fingiu que não o tinha visto e foi pra rua, debaixo de sua árvore preferida, com seu livro da vez e a xícara na mão. Entre os pensamentos uma vontade louca de falar tudo o que pensava e que fingiu não sentir. Fingia bem. O sol aquecia suas pernas enquanto à sombra da árvore se fixava no ponto mais azul do horizonte e desejava tudo aquilo novamente: as pernas tremerem, o coração disparar, a boca secar e sentir os pés pisando nuvens. Foi quando ele chegou perto e abaixou-se. Olharam-se longamente e enquanto o vento fazia as roupas no varal quase voarem pelo pátio verde um papel saiu em liberdade de dentro do livro. Ela embranqueceu e ele foi atrás. Pegou o papel marcado de dobras e do tempo e abriu. Seus olhos passavam pela folha e enchiam-se de água. Ela fechou os olhos...não queria ver a decepção instalando-se lentamente naquele coração já tão machucado. Ele voltou com o papel dobrado e estendeu a mão. Ela pegou. Ele chorava. Nenhuma palavra era necessária naquele momento. Agora sabia que não tinha um filho. Uma paternidade perdida como as escolhas que fez e os carinhos que não deu. Uma voz doída dentro do peito que queria sair, mas ela não tinha dito até agora que queria partir. Apensas dois estranhos que continuavam a conviver por falta de coragem pra continuar e pavor de pedir perdão...
Um comentário:
Ó! Um conto que poderia render muitas páginas... notei que tem uma palavra que aparece em alguns dos seus textos. A palavra "particular" é especialmente interessante por dois motivos: primeiro, porque delimita o espaço da personagem e ao mesmo tempo se impõe como condição necessária para o desenvolvimento do texto, partindo daí, tens como explorar o aspecto psicológico com mais liberdade. Segundo, pelo seu caráter intimista, o que já de si é um convite para se perder em seu infinito particular... Abraço!!!!
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